24/07/2012

Sem segurar

Tudo por equilíbrio, por um passo, pela segurança de um abraço. E lá vem aquela que anda na corda bamba encarando a queda. Vem sem respirar, com os pés apertados em um nó de medo, os olhos ofegantes e o peito encolhido. Melhor seria ver a equilibrista, que leve e reta nunca cogita cair. No máximo balança, só pra não perder o ritmo doce do andar nas alturas. É uma beleza precisa, ela vai chegar. Mas quem vem, vem cambaleando. Parece uma queda a cada passo. A corda palpita. Os pés duram uma eternidade no ar, enquanto o alívio se esvai em segundos. É feio de ver, mas é o que temos à frente dos olhos. Afinal, ela caminha. Torta, tensa e imprecisa. Um dia a corda há de acabar. E então volta o chão onde o pé, aliviado, se espalha. Esse pé descalço e ferido guardará cicatrizes de lembrança e calos com resquícios do suor da nuca e sal dos olhos. Quem balança a corda não sente a adrenalina e nem o peso nas pernas, muito menos o vácuo que invade o corpo em forma de tremor. São trinta metros de corda enroladas embaixo do colchão. Não é fácil se manter na confiança do chão.

27/04/2012

Esperança que não morre, mas mata

Existe alguma coisa mais triste que um circo maltrapilho?
Só a imaginação
essa maldita
não me deixa ser infeliz em paz

Me deixe
em paz
a sós com meu sorriso torto

Ass: Manuel, 41 anos de bobo.

26/04/2012

Vergonha, é o que sinto ao lembrar daquele período da vida. Passou por mim, cortante. Eu, sem ao menos grunhir, passei cabisbaixa. Passei, mas só o consegui porque foi despercebido. Os poucos que me viram passando (e não ouviram) pensaram com desdém: Essa aí? Deixa passar, não é nenhuma ameaça. Acertaram, minha invisibilidade não era proposital, nunca foi fruto de esperteza, era medo. Medo infantil, que me tornava tão inofensiva quanto qualquer aliado leal. Eu só era leal ao silêncio.

Minha neutralidade externa fazia de mim uma mera sombra sem contorno definido. Não me orgulho desse caminho, da minha calma excessiva, do meu desleixo, da minha indignação apática. Escolher o calar por medo de dizer tolices. Não percebia que estúpido era o meu silêncio. Calada eu não tinha rosto e assim meu desgosto, meu protesto e meu desafeto não tinham onde se expressar.

Ninguém tentou interceptar meus passos, claro, eles eram lentos e pareciam seguir a linha reta como os de todos. Ninguém obstruiu o meu caminho pelo simples fato dele não ser meu. Confundiram minha sonolência com ingenuidade. Foi sendo um fantasma que segui adiante.

A vantagem desse intervalo de tempo foram as náuseas que me fez sentir.

A humilhação acorda defuntos.

A mente não mudou muito. Muda sempre, é saudável, mas continua congruente com as inquietações do passado. Mudou o tempo, o semblante, a altura da voz. Muda uma forma ou outra, mas não muda de lado. Por dentro continuo pelo mesmo caminho, e quando posso, corro. Tenho pressa. Por fora o caminho mudou. Não sei se foram os olhos ou a paisagem.

Agora os passos são meus.

Não sei em que momento cuspi a inércia. Nem quem me ofereceu o fruto proibido. Resta-me uma dúvida e uma certeza. Minha calma, antes sedativa, agora serve para conciliá-las. Não sei como cheguei, mas sei que vim pelo lado certo.

Por mais angustiante que seja a vista que temos daqui, por mais agressivos que sejam os fantasmas de lá, por mais árduo... Continuamos passando, agora vívidos, e nossa maior e terrível ameaça é convidá-los a viver também.



Quem preferir a sombra turva que tente nos deter, mas não conte com a sorte.

A alvorada há de passar.

Por todo lugar.

06/11/2011

Se a gente fosse fogo

Findos em brasa que pudesse reascender

De pedra com pedra

De galho em folha seca

De cada calo exausto

Renasceria

Entre minhas mãos teimosas

Uma faísca que fosse

Dos teus olhos velhos

26/06/2011

Um dia sem soma


É preciso ser triste de vez em quando
Apreciar a dor

Não é nenhuma lágrima infinita
Nenhum tormento
Também não é culto ao sofrimento
Tampouco conformação

É um breve intervalo
O limiar de duas alegrias

É só um resto de dúvida, raiva e saudade
Porque a felicidade também aprisiona
A plenitude ilude
Animaliza

É preciso
ser triste
ser humano
ao menos, de vez em quando

E se é preciso
acolhamos a tristeza
Que assim ela há de ficar mais leve

Sejas benvinda.

06/04/2011



Eles me inspiram. Suas presenças me fazem pensar, e é do meu pensamento que surgem meus sentimentos mais louváveis. Chego a sentir orgulho de existir. Eles me obrigam, com um carinho leve, a querer ser melhor. "Minha filha, seja o que for mas seja uma boa pessoa". Palavras de um deles, palavras que nunca deixam de ecoar. Uma boa pessoa. Eu tento, manhã após cada noite me levanto (muita vezes já pela tarde) com um único propósito, ser alguém merecedor de todos eles. Deles que me permitem um pensamento leve, sem dor, sem franzido na testa. Que me levam a ter ideias simples, mas cheias de filosofia. Não é uma grande poesia, é magra como eu. Pouco recheio, muito espírito. Meu espírito me ultrapassa, porque são eles que o constituem. São o que há de melhor em mim.

Inúmeras vezes me ouço declamar opiniões que nem acredito serem minhas, que brotam com o estímulo das conversas mais infantis, das filosofias mais cotidianas. Às vezes, basta a presença, o silêncio ou a lembrança. Até com suas risadas me fazem ver melhor, ver de verdade, me mostram a essência das coisas.

E quando percebo a imensa sorte de "tê-los"sempre chego a acreditar que pronto, conheci todos os melhores seres da humanidade, não é possível que existem outras pessoas tão belas! E então, mais uma vez, eu me traio e me apaixono. Eis que surgem mais deles, mais inspiradores para os dias. Nunca são muitos, chegam aos poucos, lentamente. Alguns quase imperceptíveis. Quando me espanto, depois de um breve processo de compatibilidade espiritual, eles já fazem parte de mim. Já não saberei mais levantar se não for para merecê-los também. E levanto cada dia maior, mesmo conservando meu metro e sessenta. Maior de fé.

Não posso comprovar deus, nem ousaria, mas provo do amor descrito por ele. Eles me fazem sentir, acreditar. Se o inferno é aqui, o céu também pode ser. É a força necessária para fazer algo bom acontecer.

Portanto, tu que me amas, se é que alguém ama, saibas que me amar não é amar a mim, é amar a eles. Porque são eles tudo o que de amável existe aqui.

Aos meus amigos.

13/03/2011

"Porque o tempo nos olha"




Tempo é ar em movimento
Os fatos não cabem em uma vida
Então o vento leva o que pode arrastar
O que é leve passa
O resto persiste
Lágrimas são leves feito plumas
E o riso que peso tem?
O que me resta?
Meu tempo não segue convenção
O dia ultrapassa as 24 horas
Pesa além das 24 gramas
Engana-se o vento

Com quantos segundos se faz um infinito?
Quantos gramas um segundo tem?